A definição tradicional da ciência da nutrição é basicamente: atuar na prevenção, promoção e recuperação da saúde humana, planejando, executando e avaliando ações baseadas nos conhecimentos da ciência da nutrição e alimentação. Entretanto, nos últimos anos, pesquisas em nutrição começaram a descobrir que os genes e dietas estão mais interligados do que se imaginava.
Imagine o cenário: dois homens da mesma idade, “na mesma velocidade” (risos), possuem uma dieta pobre em frutas e vegetais, elevada em sódio e gordura trans. Um desenvolve hipertensão, hipercolesterolemia e aterosclerose, enquanto o outro vive uma vida longa sem nenhuma doença crônica. Outro exemplo são duas mulheres que adoram consumir leite, mas para uma o alimento provoca gases e diarreia, enquanto para outra é possível ingeri-lo sem problemas. A diferença é que uma tem intolerância à lactose e a outra não.
A questão é: por que os indivíduos experimentam diferentes resultados de saúde, embora tenham dieta e estilo de vida semelhantes?
O reconhecimento de que os nutrientes têm a capacidade de interagir e modular mecanismos moleculares e funções fisiológicas de um organismo provocou uma revolução no domínio da alimentação. Apenas suspeitava-se que a genética desempenhasse um papel crítico na resposta à ingestão alimentar, mas para estudar esse tema mais profundamente, dois campos de pesquisas surgiram há alguns anos: Nutrigenômica e Nutrigenética.
Basicamente, nutrigenética é a ciência que estuda como a constituição genética de uma pessoa afeta sua resposta à dieta, enquanto a nutrigenômica é a ciência que estuda o papel dos nutrientes e compostos bioativos de diferentes alimentos na sinalização gênica.
Relembrar o conceito de genoma é importante para entender melhor as duas áreas. Genoma é conjunto de todo material genético presentes nas células, ou seja, é o nosso DNA. O primeiro relatório sobre o projeto de sequenciamento do genoma humano foi publicado em 2001 e identificou todos os genes presentes no DNA humano, o que permitiu a descoberta de que os genes e proteínas não funcionam isoladamente, e sim atuam em conjunto com os nutrientes provenientes da dieta.
Segundo Fenech e colaboradores (2011), há três fatores centrais que sustentam a importância da nutrigenética e nutrigenômica como ciência:
Grande diversidade no genoma entre grupos étnicos e indivíduos, cuja diferenciação afeta a biodisponibilidade de nutrientes e o metabolismo.
A alimentação das pessoas e a disponibilidade de nutrientes diferem muito entre si, pois são dependentes de fatores culturais, econômicos, geográficos e gustativos.
A desnutrição ou hiperalimentação (deficiência ou o excesso) pode afetar a expressão do gene e a estabilidade do genoma, alterando sua estrutura funcional. Resultado: possíveis mutações da sequência de genes ou a nível cromossômico, ocasionando expressão gênica anormal e levando a fenótipos adversos durante as várias fases da vida.
Entretanto, o terceiro fator pode afetar a expressão genética, não necessariamente alterando a sequência ou estrutura do gene. Essa é uma outra área emergente e mais recente: a epigenética. Por exemplo, uma pessoa possui estilo de vida e dieta que podem estar lhe causando aumento da concentração de colesterol no sangue. Porém, uma vez que todos os âmbitos forem equilibrados, os níveis sanguíneos de colesterol podem voltar ao normal.
Como o nutricionista pode aplicar essa nova ferramenta?
A nutrigenética e a nutrigenômica promovem a ideia da nutrição personalizada. Certamente, as recomendações dietéticas de base populacional são úteis, mas elas não são adequadas para todos os indivíduos, uma vez que as pessoas respondem diferentemente às dietas.
Hoje em dia as prescrições nutricionais são personalizadas com base na composição genética, evitando doenças crônicas não transmissíveis, conhecidas como doenças multigênicas – atuação de diversos genes em conjunto.
A genotipagem completa ainda não está amplamente difundida de maneira comercial para identificar quais são todas as intolerâncias ou quais alimentos estimulam genes para doenças crônicas, mas é possível realizar testes genéticos que avaliam uma quantidade menor de variantes genéticas mas que são relevantes como o mapeamento da DNA Club. Através do sequenciamento da amostra genética por MicroArray, identifica-se aproximadamente 790.000 polimorfismos. Com o resultado em mãos, o nutricionista irá adequar a dieta do paciente com base em seus relatos de estilo de vida e alimentação, sinais clínicos, histórico familiar, rastreamento metabólico e genótipos encontrados no mapeamento genético.
Referências
A diferença entre Nutrigenômica e Nutrigenética. Dietbox, 2017. Disponível em: https://blog.dietbox.me/a-diferenca-entre-nutrigenomica-e-nutrigenetica/ Acesso em: 08 Fev 2022.
ABRAN. A Nutrigenômica, a Nutrigenética e a Epigenética como meios para alcançar o potencial da nutrição, manter a saúde e prevenir doenças. Fev/2013.
Fenech M. Nutrigenetics and Nutrigenomics: Viewpoints on the Current Status and Applications in Nutrition Research and Practice. J Nutrigenet Nutrigenomics. 2011 Jul; 4(2): 69–89.
Tamires Aline de Oliveira
Nutricionista